Uma nova série sobre as novas tempestades que se vislumbram já no horizonte
Seleção e tradução de Júlio Marques Mota
Parte I – 7. Como é que os défices crescentes, os enormes buracos na lei e os pequenos ganhos familiares são uma praga para a reforma fiscal (2ª parte)
Por Kent Smetters
Publicado Wharton School, , em 7 de dezembro de 2017
Kent Smetters, da Wharton, explica como o Penn Wharton Budget Model põe em causa muitas afirmações de numerosos defensores da reforma fiscal americana apresentada por Trump.
(2ª parte)
Knowledge@Wharton: O modelo tem alguma coisa a ver com a medição da riqueza?
Smetters: Sim. Para a maior parte das pessoas o aumento na riqueza é razoavelmente proporcional ao seu progresso no escalão de tributação fiscal. E por isso não é de surpreender que ao olharmos para a mudança na percentagem de riqueza, para as famílias de baixo rendimento, 50% das famílias nos Estados Unidos não têm poupanças significativas fora dos esquemas da Segurança Social para a reforma, por exemplo. E, por isso, quanto à segurança no tempo de vida na reforma, há aqui muito pouca ajuda para esta escala de rendimentos. Quando se lhes dá uma redução nos seus impostos, eles gastam imediatamente o dinheiro. Eles são o que chamamos de gente condicionada pelas dívidas. Portanto, não é surpreendente que aqueles que não estão condicionados por dívidas possam poupar mais dinheiro e investi-lo e assim por diante. Assim, o que realmente se consegue parece ser um aumento da desigualdade de riqueza, mas novamente estamos a falar apenas de uma ninharia – não é grande coisa.
Se, de facto, o Congresso estivesse realmente preocupado com isto, há aqui o que se chama o dois-em-um em termos de crescimento económico e até de distribuição de riqueza. E isto é: concentremo-nos menos em cortes de impostos pelo lado das empresas e concentremo-nos muito mais em despesa com novos investimentos. As taxas de redução fiscal atualmente não recompensam apenas os novos investimentos; a redução fiscal recompensa todos os investimentos que já foram feitos e que serão sujeitos a tributação fiscal. Focalizemo-nos então muito mais estreitamente sobre a compensação a ser feita sobre as despesas efetuadas somente com os novos investimentos.
A compensação sobre as despesas em novos investimentos é pois mais um estímulo e é menos uma recompensa para os acionistas atuais.
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Knowledge@Wharton: O projeto de lei prevê que os impostos sobre as empresas serão reduzidos de 35% para 20%. Irão as empresas trazer para casa muito do dinheiro, cerca de $2,5 milhões de milhões, que elas mantêm no exterior e tirar proveito dessas taxas mais baixas? E se assim for, quanto é que poderão trazer para casa? O que é que vão fazer com este dinheiro que entra no país? Será que vão investir? Eles vão reduzir a dívida, dar a maior parte aos acionistas, recomprar as suas próprias ações, contratar mais trabalhadores?
Smetters: É improvável que a longo prazo possamos ver grandes mudanças. Do que estamos a falar, é mais de mudanças temporárias. Sob a versão do Câmara dos Representantes e sob a versão do Senado do projeto de lei, todos aqueles ganhos vindos do estrangeiro – aqueles 2,5 milhões de milhões localizados em paraísos fiscais – são considerados como automaticamente repatriados. O que isso significa é que se trata de um imposto que está por pagar. Mas é um imposto que está por pagar a uma taxa especial; vai ser pago à taxa de 10%. E mesmo assim pode ser pago ao longo de muitos anos- não é tudo para ser pago de uma só vez.
Assim, sob a lei atual, o grande problema é que esses ganhos não estão sujeitos ao imposto dos EUA sobre as empresas até que sejam repatriados e trazidos de volta para o país. E há algumas lacunas da era Clinton que permitiam essa exploração. Assim, estes planos foram basicamente feitos para dizer que todo esse dinheiro é agora repatriado automaticamente, independentemente de onde esteja. Paga-se uma taxa de 10%, o governo dar-lhe-á muitos anos- provavelmente uma década para pagar essa taxa de 10%. Então vamos ver algum dinheiro a regressar, dinheiro este que estava artificialmente nos paraísos fiscais.
O que vai acontecer com esse dinheiro? Esse é um grande debate que se está agora a realizar. Mas é provável que algum dele seja pago em dividendos mais elevados, algum outro será gasto em recompras de ações e alguma outra parte será provavelmente investida. Nós não pensamos que o canal de investimento vá ser tão grande como algumas pessoas andam por aí a dizer, e a razão pela qual é assim é que já existem algumas formas de financiamento inteligente.
Por exemplo, a Microsoft e muitas das outras empresas que têm muito dinheiro no exterior, são inteligentes e não pagam dividendos com esse dinheiro que está em offshores porque isso seria ineficaz em termos de impostos. Elas realmente emitem nova dívida para pagar dividendos já hoje. E assim elas não se sentem na verdade muito constrangidas em fazer os investimentos que de outra forma desejariam fazer nos Estados Unidos. Assim, na maior parte, esse repatriamento – a maior parte desse dinheiro, vai para os acionistas sob a forma de dividendos e para a recompra de ações.
A verdadeira questão é então: o que vai acontecer a longo prazo? A longo prazo, após esta reinicialização única, encontrar-nos-emos ainda perante o mesmo problema. Sim, a taxa de tributação aplicada às empresas nos EUA será menor. Mas esta taxa não será suficientemente baixa para parar com esse problema do dinheiro ganho e colocado no estrangeiro, nos mercados offshore, porque ainda continuará a ser mais barato fazer a dupla inversão sanduíche irlandesa / holandesa e utilizar todas as outras técnicas extravagantes.
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E, a propósito, estes projetos de leis fiscais, tal como estão escritos atualmente, têm enormes lacunas, ou seja, permitem grandes esquemas de evasão fiscal. Os seus proponentes estão meio conscientes disso. Eles estão a tentar apressar-se e estão a consertar algumas dessas coisas, mas é quase impossível resolver tudo isto antes do final do ano [2017]. Teríamos necessidade de meses de discussão com diversos especialistas em fiscalidade para compreender todas estas coisas.
Knowledge@Wharton: Então, tudo isso poderia facilmente ser legal antes de termos realmente uma ideia séria sobre quais serão os resultados?
Smetters: Isso mesmo.
Knowledge@Wharton: Duas questões sobre o que estamos aqui a falar. Uma delas é: os níveis de dívida das grandes empresas são bastante elevados agora. Acha que isso levará a um pagamento de uma parte dessa dívida, uma vez que elas não se irão financiar da mesma maneira?
(continua)
Texto disponível em http://knowledge.wharton.upenn.edu/article/how-rising-deficits-huge-loopholes-and-paltry-family-gains-plague-tax-reform/
Notas
[2] NT.: As regras de ‘empresa estrangeira controlada’ procuram reduzir a capacidade das empresas de mover lucros de um país para outro por meio de uma transação de papelada pura para o que é realmente a mesma empresa.
[3] Os Estados Unidos cobrarão imposto quando o dinheiro é pago como dividendos à empresa mãe—mas isso pode ser protelado simplesmente não pagando tias dividendos. Atualmente, estima-se (citado em Kleinbard, 2013) que quase US$2 milhões de milhões são deixados no exterior por empresas dos EUA.