Selecção e tradução por Júlio Marques Mota
A Europa não tem alavancas para o crescimento – II
Delusional Economics – 28 de junho de 2012
(conclusão)
Como nós, como o blog A Viagem dos Argonautas vê Mariano Rajoy.
Entretanto, parece que o BCE também está a ficar cada vez mais preocupado com a esperada falta de acção política da própria cimeira e com o boato de que uma política de taxa de juro a zero (a zero-interest rate policy (ZIRP) ) ou mesmo negativa ( NIRP) poderia estar já a ser trabalhada pelo BCE para os depósitos juntos desta Instituição:
O Presidente do Banco Central Europeu Mario Draghi está a encarar a hipótese de colocar as taxa de juro numa zona de penumbra que foi sempre evitada pelo Federal Reserve nos Estados Unidos. Enquanto o corte nas taxas de juro do BCE podem aumentar a confiança, estimular o crédito e promover o crescimento, o mesmo efeito se poderia também ter ao envolver a redução da taxa bancária de depósito junto do BCE a nível zero ou até mesmo inferior. Uma vez que se trata de um obstáculo para os decisores políticos, porque se corre o risco de ferir os mercados financeiros que eles estão a tentar apoiar, cortar a taxa de depósito de 0,25 por cento deixou de ser um tabu, disseram dois altos funcionários do Banco Central Europeu, em 15 de Junho.
O BCE utiliza três taxas de juros para orientar os custos dos empréstimos nos mercados financeiros. A taxa principal de refinanciamento determina a taxa de juro que os bancos pagam para os empréstimos contraídos junto do BCE, enquanto a taxa de depósito e as taxas marginais fornecem um mínimo e um máximo para as taxas de juro que se aplica a cada um dos bancos a muito curto prazo, em overnight.
Se a taxa de depósito for reduzida a zero ou mesmo negativa , isto seria desencorajar os bancos de colocarem junto do BCE os seus excessos de liquidez em overnight, a procurar portanto que estes emprestem a liquidez em excesso. Há quase 800 mil milhões de euros que estão assim depositados junto do BCE diariamente.
Por outro lado, um corte na taxa de depósito pode prejudicar a rentabilidade dos bancos por reduzir as taxas do mercado monetário, pode potencialmente prejudicar a oferta de crédito às empresas e às famílias e pode reduzir o incentivo dos bancos a emprestarem liquidez a outras instituições financeiras.
Vamos ser claros sobre isso. Os relatórios bancários publicados pelo próprio BCE afirmam claramente que a falta de expansão do crédito é uma questão de procura. Aqui está o que dizem sobre a oferta:
“De acordo com o levantamento dos empréstimos em Abril de 2012 publicado no inquérito feito aos bancos (BLS), a clara restrição dos padrões de crédito pelos bancos da área do euro diminuiu substancialmente no primeiro trimestre de 2012, tanto para empréstimos a sociedades não financeiras (para as quais desceu para 9% em termos líquidos quando era de 35% no quarto trimestre de 2011) como para os empréstimos às famílias (nos empréstimos para aquisição de habitação caíram para 17% quando era de 29% no quarto trimestre de 2011 e quanto ao crédito ao consumo desceu de 13% no quarto trimestre de 2011 para 5% agora). Esta queda foi muito mais pronunciada do que a taxa prevista pelos participantes do inquérito no momento em foram feitos os inquéritos da ronda anterior e reflectiu, principalmente, as menores pressões quanto ao custo dos fundos e às restrições nas contas dos bancos, nomeadamente no que respeita ao acesso dos bancos ao financiamento e à sua posição de liquidez.
Olhando para o segundo trimestre de 2012, os bancos da zona euro esperam uma nova redução na restritividade líquida dos padrões de crédito para empréstimos a sociedades não financeiras (SNF) (de 2% no segundo trimestre de 2012) e para os empréstimos à habitação (de 7% no segundo trimestre de 2012), e um nível praticamente inalterado de restritividade líquida do crédito ao consumo (6% para o segundo trimestre de 2012)”.
E segue-se :
“Os bancos da zona euro referiram-se a uma queda considerável na procura líquida de empréstimos para as empresas não-financeiras no primeiro trimestre de 2012 (-30%, quando era de -5% no quarto trimestre de 2011). Essa queda líquida na procura de empréstimos agora a um nível significativamente mais baixo do que o esperado no quarto trimestre de 2011, deve-se fundamentalmente a uma queda acentuada das necessidades de financiamento em investimento fixo. Da mesma forma, a procura líquida de empréstimos para as famílias diminuiu ainda mais no primeiro trimestre de 2012 (-43% quando era de -27% no quarto trimestre de 2011 para os empréstimos destinados à aquisição de habitação e de -26% quando era de -16% no quarto trimestre de 2011 quanto ao crédito ao consumo), valores estes em concordância com as expectativas relatadas na ronda anterior de inquéritos para empréstimos à habitação e abaixo das expectativas relatadas para o crédito ao consumo.”
Esse é um comportamento clássico em período de recessão. Muitas áreas da Europa têm visto uma perda significativa da riqueza do sector privado provocada pela crise financeira global e pelas quedas de preços dos activos que lhe está associada. Em resposta a esta quebra de riqueza o sector privado adaptou o seu comportamento na tentativa de pagar as dívidas porque o seu ratio de activos relativamente à dívida tenha muito rapidamente descido. Nestas regiões, a redução das taxas de juros não provoca nenhum aumento dos empréstimos. Na verdade, se os Estados Unidos nos podem servir de guia , processa-se um efeito de desalavancagem porque as pessoas aproveitam a oportunidade para se refinanciar a taxas mais baixas para pagar a dívida ainda mais rapidamente.
As famílias nas economias em dificuldades não têm a capacidade para assumirem mais dívidas e, portanto, as actividades empresariais nessas áreas não têm nenhuma razão para investir no aumento da produção porque em princípio não encontrarão clientes dispostos a comprar os seus produtos adicionais. A fim de criar uma maior procura na economia e, portanto, um maior rendimento nacional, o sector privado precisa, em primeiro lugar, de financeiramente se equilibrar .
Num ambiente de estagnação ou de redução no consumo interno e num ambiente também de taxa de juro perto de zero isto só pode ser conseguido de três maneiras:
• um aumento da actividade económica provocada pela procura externa
• redução da carga tributária sobre o sector privado
• a anulação parcial ou total da dívida existente
Quanto ao primeiro ponto, como se deve ter já notado a partir das notas de informação de PMIs recentes, a procura externa está a diminuír. Quanto ao segundo ponto, continuamos a ver o oposto nos governos nacionais:
O governo espanhol está a estudar aumentos de impostos para conter o défice orçamental, incluindo a revogação de uma dedução para as famílias com habitação própria que o primeiro-ministro Mariano Rajoy tinha lançado há seis meses para cumprir uma promessa de campanha.
O governo precisa ligar o défice, uma vez que os dados mostraram um aumento do défice da administração central para os primeiros cinco meses que se aproximam já dos valores estimados para o ano inteiro enquanto o Banco da Espanha informa que a recessão aumentou ainda mais no segundo trimestre. O governo de Madrid, pode eliminar a redução de imposto que antes tinha sido oferecida aos detentores de casa própria sob hipoteca e criar taxas sobre o meio ambiente, disse ontem o vice-ministro do Orçamento Marta Fernandez Curras.
Quanto ao terceiro ponto, continuamos a ver a Europa a aplicar políticas que asseguram aos bancos que estes nunca terão de sentir os efeitos, os custos, das suas erradas decisões quanto à concessão de empréstimos e em que a carga desses múltiplos erros é transferida para o sector privado não financeiro. A operação de resgate espanhol é disso um muito claro exemplo.
Então, na minha humilde opinião, a Europa tornou-se uma mistura de política monetária ineficaz ainda por cima a somar a uma política orçamental errada . A única coisa que pode possível arrancar a Europa para fora do atoleiro económico em que está metida é actualmente uma vontade de forte cooperação política
Será necessário dizer mais?