Um conjunto de 4 textos que põem em evidência o contraste entre visões esclarecedoras sobre as causas das dificuldades de resposta sanitária a esta crise do coronavírus, quer sejam de direita conservadora inglesa, de que se pode discordar mas que tem nível, (Ambrose Pritchard), quer sejam de esquerda (Júlio Marques Mota, Vivien Schmidt), e uma abordagem da crise pandémica à moda da direita portuguesa mais reacionária (aqui representada por Camilo Lourenço). São os seguintes:
Texto 1. As análises de Camilo Lourenço – uma visão crítica. Por Júlio Marques Mota
Texto 2. Camilo Lourenço e o Serviço Nacional de Saúde. Por Júlio Marques Mota
Texto 3. A EU responde ao coronavírus: o já visto, outra vez?. Por Vivien Schmidt
Texto 4. O sistema bancário mundial não pode resistir a um longo bloqueio económico. Por Ambrose Evans-Pritchard
FT
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Texto 1. As análises de Camilo Lourenço – uma visão crítica
Por Júlio Marques Mota
Coimbra, 25 de Março de 2020
A dita chantagem sobre a banca portuguesa
Nestes tempos de quarentena grande parte desse tempo de nada fazer é consumido a passear os olhos pelos jornais. Um deles, foi o Jornal de Negócios e dou de frente com um jornalista que conhecia da Televisão, dos tempos da Troika, da austeridade em que se assumia seu defensor, de seu nome Camilo Lourenço.
Refiro-me a duas pequenas crónicas, a primeira a ser fortemente crítica em relação a António Costa e à resposta à crise sanitária e a outra relativamente à banca portuguesa que tem como missão “proteger as nossas poupanças”, na sua opinião e cujos banqueiros estão a ser objeto de uma suposta chantagem moral.
Quanto à primeira dessas crónicas, irei abordá-la depois com um texto (texto 2 desta série) em que afirmo concordar com muitas das linhas que Camilo Lourenço escreveu, com uma diferença de monta: o alvo que ele escolheu está errado. Se temos um mau Serviço Nacional de Saúde devemo-lo sobretudo a Cavaco, Durão Barroso e, sobretudo, a Passos Coelho e aos seus patrões que deram pelo nome de Troika, não esquecendo pelo caminho Sócrates. Se críticas fortes há a fazer quanto aos meios disponibilizados para o combate à crise sanitária é à União Europeia e à sua politica de austeridade imposta mas não por ela assumida, porque são para a força dos Tratados que as críticas aproveitáveis do texto de Camilo devem ser dirigidas, e não a António Costa que não dispõe de meios para quase nada. E com esse quase nada está a fazer quase tudo o que outros não fizeram, está a fazer quase tudo.
Quanto à segunda crónica de Camilo Lourenço – o que ele designa como “A inaceitável chantagem moral sobre os banqueiros”:
No espaço de uma semana tivemos três políticos a falar de banca. O primeiro foi António Costa, que colocou o setor perante um dilema moral: se os portugueses ajudaram os bancos há dez anos, é altura de retribuírem esses sacrifícios. Depois veio Rui Rio, com uma “tirada” inenarrável, alegando que em 2020 e 2021 os bancos não podem ter lucros. Já no fim de semana foi a vez do Presidente da República, com argumentos muito próximos dos de Costa: os portugueses ajudaram-vos num momento difícil, agora é a vossa vez.
Há dois disparates monumentais nestes comportamentos:
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- As pessoas que dirigem os principais bancos portugueses (Pedro Castro Almeida, Santander, Paulo macedo, CGD, Miguel Maya, BCP, António Ramalho, Novo Banco, tiveram alguma coisa a ver com os desmandos da banca, que terminaram em injeções de capital e com o desaparecimento de quatro marcas nos últimos dez anos? Zero. Se é assim, que sentido faz esta “chantagem moral”?
- A pressão política sobre os banqueiros pode correr mal. Se os banqueiros relaxarem as regras de análise de risco para apoiar indiscriminadamente empresas e ou particulares, vão ficar com novos buracos nas contas. E isso significa chamar novamente os contribuintes.
Acresce que António Costa, Marcelo Rebelo de Sousa e Rui Rio se estão a esquecer que a primeira e mais importante, principal preocupação dos bancos é a proteção das poupanças ( não o apoio “político” à economia). Além de que, convém lembrar, os bancos não recebem ordens de políticos em Lisboa; quem os supervisiona é Frankfurt.
Eu sei que já estamos em campanha eleitoral. Mas por favor poupem-nos a populismo rasca “
Em relação a este texto, limitar-me-ei a tomar como textos de contraponto e de crítica, um texto da direita inglesa, de um dos seus ícones jornalísticos mais relevantes hoje, Ambrose Evans-Pritchard (texto 4 desta pequena série), e uma pequena nota de uma professora da Universidade de Boston, especialista em assuntos europeus e professora visitante em vários dos países da UE, Vivien Schmidt (texto 3 desta série). Ambos estes dois textos, servem de contraponto ao que diz Camilo Lourenço sobre os políticos (portugueses) e as suas exigências à banca, deixando bem em evidência o que é uma crítica de direita (Pritchard) e também de esquerda (Schmidt), por comparação com uma crítica de direita à portuguesa (Lourenço).