O ROMANTISMO SOCIAL PORTUGUÊS: II – Almeida Garrett, por Sílvio Castro.

Almeida Garrett é, quase certamente, o primeiro romântico na literatura portuguesa que incorpora a uma inicial predisposição individualista determinada consciência política. Daí a sua particular importância no quadro do Romantismo social português, para o qual traz marcantes contribuições.

Escritor de evidente formação árcade e iluminista, ele assiste à passagem do tempo setecentista, marcado particularmente pela política cultural do regime pombalino, àquele oitocentista, começado pelas crises institucionais que principiam com o reinado de D. Maria I, se alarga com a invasão napoleônica, o fim da mesma, a revolução de 1820 e a fase do “vintismo”, até chegar às lutas fraticidas culminadas com a vitória de D. Pedro IV e correspondente restauração de uma certa estabilidade nacional.

O jovem Garret, partindo de suas raízes neo-clássicas, vive intensamente o período da revolução liberal e da passagem àquela outra, do Romantismo, revelando-se extremo partecipante de ambas e, consequentemente, sempre traduzindo uma personalidade fortemente capaz de ação política e de criatividade artística. Serão essas qualidades que lhe permitirão absorver as novidades internacionais do novo tempo romântico, ao qual dá uma contribuição historicamente essencial, inaugurando-o na literatura portuguesa com a publicação, em 1825, de seu poema Camões.

Nos versos do Camões, ainda que mais ligado às lições românticas inglesas, Garrett traduz em maneira coerente a tópica “Nação“, e derivadas, próprias da doutrina schleguiana. A idéia de “Pátria“, enquanto valor sentimental, de grande intensidade civil, com o poema garrettiano entra a fazer parte da essencialidade do Romantismo nacional.

Filho da alta burguezia, o autor de Adozinda revela, entretanto, desde sua juventude, ideais revolucionários nascidos de clara personalidade forjada nas lições do Liberalismo mais avançado. Ainda aqui, nas manifestações de seu alto espírito liberal, Garrett traduz a sua inicial formação árcade. O mesmo Iluminismo setecentista que o conduz à prática literária, serve-lhe de guia na formação de sua personalidade política.

O Liberalismo garrettiano é constantemente atento e revolucionário. Nos momentos mais dramáticos da vida do país, nas primeiras décadas do difícil século XIX, logo depois dos atormentados tempos napoleônicos, o civismo ativo de Garrett sabe manifestar-se de forma tal a marcar a história do pensamento político português. O seu espírito de participação demonstra excepcional exemplo na sua Carta de guia para eleitores em que se trata da opinião pública, das qualidades para deputado e do modo de as conhecer, feita para orientação do eleitor partecipante ao pleito de 1826, em plena efervecência dos novos tempos de D. Pedro IV.

O ativismo político de Garrett, encontra um seu correspondente literário nas páginas inovadoras de as Viagens na Minha Terra. Nessas páginas marcantes da literatura portuguesa, umas das tópicas mais típicas do Romantismo internacional, a da “questão da língua”, aliada aos conceitos de “Pátria” e de “Nação”, se traduz em uma obra-prima. A tópica é manifestada de modos diversos nas várias literaturas nacionais, conforme às correspondentes condições linguísticas: fortemente distinta no Manzoni dos Promessi Sposi, produto de uma decidida escolha por uma das muitas expressões dialetais da península itálica, ao par de quanto não fosse a comedida ação linguística da operação garrettiana, ou da ainda mais medida operação da prosa de José de Alencar, no Romantismo brasileiro. Ainda que quase somente limitada a um uso estilisticamente literário da linguagem oral e da fala popular portuguesa, com rápidas ousadias no plano lexical, as Viagens demonstram uma consciente modernização da língua em confronto com as pedagógicas fixações promulgadas pela não-indiscutível reforma pombalina:

“Também são chegados os outros companheiros; o sino dá o último rebate. Partimos. Numa regata de vapores o nosso barco não ganhava de-certo o prémio. E se, no andar do progresso, se chegarem a instituir alguns ístmicos ou olímpicos para êste gênero de carreiras – e se para elas houver algum Píndaro ansioso de correr, em estrofes e antistrofes, atrás do vencedor que vai coroar de seus hinos imortais – não cabe nem um triste minguado épodo a êste cansado corredor de Vila-nova. É um barco sério e sisudo que se não mete nessas andanças.”

5 Comments

  1. O poema “Camões”, de almeida Garrett é o marco do Romantismo em Portugal. A produção poética de Garrett costuma ser associada a qual das fases dessa estéticas literária?
    a). ( ) Terceira fase ou transição para o Realismo b). ( ) Terceira fase ou ultrarromantismo c). ( ) Primeira fase ou ultrarromantismo d). ( ) Primeira fase ou neoclassicismo e). ( ) Segunda fase ou ultrarromantismo

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