
Seleção e tradução de Júlio Marques Mota
Parte IV – A titularização como meio para continuar na trajetória da crise
4. Dez anos depois – O pacote legislativo de 2017 sobre o sistema bancário: um passo à frente, dois passos atrás (1ª parte).
Por Christian M. Stiefmüller, Analista
Publicado por Finance Watch, em junho de 2017
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Índice
A. Sumário executivo
- Pontos chaves e recomendações
B. Observações gerais
- O particularismo europeu: uma narrativa questionável
- A grande imagem: “Demasiado grande para falir” ainda está por resolver
- Proporcionalidade
C. Comentários sobre determinadas medidas individuais
- O Regulamento relativo aos requisitos de capital (CRR II)
- A Diretiva relativa aos requisitos de capital (CRD V)
- TLAC/MREL [NT 1] e outras modificações do Regime de Recuperação e Resolução
Notas
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A. Sumário Executivo
Dez anos após o início da crise financeira mais grave na história recente, a União Europeia prepara-se para dar os toques finais na peça central do seu projeto de regulação pós-crise. O pacote legislativo sobre a banca incorpora o último lote de normas internacionais-chave nas leis da UE, embora de uma forma curiosamente relutante e nada ambiciosa. Ao mesmo tempo, também começa a desmantelar elementos significativos do quadro prudencial existente. Dado que muitas das causas fundamentais da última crise permanecem por resolver, embora os governos e os bancos centrais recorram ao estímulo monetário numa escala sem precedentes para compensar a fragilidade contínua do sistema financeiro, não há, na nossa opinião, motivos para complacência, muito menos ainda se pode admitir um retorno aos “negócios como de costume”. A recuperação económica na Europa ainda é frágil. A UE, em geral, e alguns Estados-Membros, em particular, seriam duramente pressionados a absorver outra crise sistémica. Ainda são necessárias novas reformas para melhorar a resiliência do sector bancário de modo a transformar a atual recuperação cíclica numa recuperação estrutural sustentável.
Finance Watch congratula-se com a proposta legislativa da Comissão Europeia, que incorpora novas normas internacionais importantes para o direito europeu. No entanto, não partilhamos a opinião de que o esforço regulamentar desencadeado pela última crise financeira esteja quase completo e que pode até ter ido longe demais. Não existem, na nossa opinião, argumentos convincentes para se inverter o progresso regulamentar dos últimos anos.
- Pontos chave e recomendações
Não existem provas conclusivas do argumento de que a regulamentação pós-crise do setor bancário está a sufocar a oferta de crédito e o crescimento económico. Pelo contrário, o crédito é abundante e, nalguns Estados-Membros, uma vez mais está a conduzir os preços dos ativos para níveis perigosos. |
1 |
A análise recente do quadro de Basileia III feita pelo Banco Internacional de Pagamentos indica que os ganhos da estabilidade financeira superam o custo da regulação e poderiam mesmo contribuir materialmente para o crescimento económico. |
2 |
O problema das instituições financeiras “demasiado grandes para falirem”, o maior risco de estabilidade financeira posto em destaque pela última crise financeira, continua por resolver. Os bancos sistemicamente importantes, globais e nacionais, ainda pesam fortemente sobre todo o setor bancário e financeiro e até agora a sua dimensão e complexidade quase não mudaram. |
3 |
Os grandes bancos ainda são vistos como “tesouros nacionais” por muitos decisores políticos que estão a mostrar uma inclinação preocupante para socorrer e resgatar as instituições falidas com o dinheiro dos contribuintes. A menos que seja revogada, a cláusula da “recapitalização preventiva” poderá acabar por relegar para a irrelevância o quadro da UE sobre resolução bancária. |
4 |
As sugestões para diluir radicalmente as normas prudenciais existentes, transformando os requisitos prudenciais vinculativos em normas “orientadoras”, e para restringir severamente a capacidade dos supervisores para imporem requisitos mais rigorosos aos bancos individualmente são totalmente contraproducentes e devem ser rejeitadas. |
5 |
Não há coerência na aplicação de instrumentos macro prudenciais, tais como as sobretaxas de capital para instituições de importância sistémica, em todos os Estados-membros da UE. É inaceitável que os supervisores nacionais sejam impedidos de impor os requisitos do pilar 2 para resolver riscos macro prudenciais, enquanto a consistência e a implementação efetiva destes instrumentos específicos não estiver garantida a nível da UE. |
6 |
A introdução do rácio de alavancagem de Basileia III é um passo em frente na boa direção, embora notemos que a atual definição proposta pelo Comité de Basileia abrange, mais uma vez, demasiados elementos do quadro sensível ao risco, em especial para exposições sobre produtos derivadas (SA-CCR). |
7 |
A aplicação do rácio de alavancagem de Basileia III na proposta atual não vai, contudo, mais longe do que o mínimo de 3%. Analogamente ao quadro do capital ponderado pelo risco – e em consonância com o precedente suíço e dos EUA – os bancos globais (G-SIBs) e os nacionais (D-SIBs), devem estar sujeitas a requisitos mínimos mais elevados. |
8 |
Para restabelecer condições equitativas e reduzir a carga nos bancos mais pequenos, que são desproporcionadamente afetados pela ineficiência dos atuais sistemas e processos de relatórios regulamentares, apoiamos firmemente a introdução de formatos e de interfaces de relatórios unificados à escala da UE e através de um único ponto de contacto. |
9 |
(continua)
Texto disponível em http://www.finance-watch.org/ifile/Publications/Reports/Finance-Watch-Policy-Brief-June-2017.pdf
Nota de tradutor
[NT1] Nota de Tradutor. MREL- Minimum Required Eligible Capital-Requisitos mínimos de fundos próprios e responsabilidades elegíveis; TLAC – total loss-absorbing capacity , Capacidade de Absorção Total de Perdas